Motorista quebra o silêncio e revela o que viveu no autocarro incendiado em Loures
Tiago Cacais, motorista da Carris Metropolitana e a vítima mais gravemente ferida nos tumultos que abalaram a Grande Lisboa após a morte de Odair Moniz, mostrou o rosto pela primeira vez mais de um ano depois do ataque que quase lhe tirou a vida. O episódio ocorreu em outubro de 2024, em Loures, quando o motorista foi surpreendido por um grupo que incendiou o autocarro onde trabalhava.
Tiago fazia a mesma carreira há mais de um ano e nada o preparara para o que encontrou naquela madrugada. Ao chegar à última paragem na Cidade Nova, ouviu um estrondo vindo do lado direito da viatura. Em segundos, viu um grupo aproximar-se com cocktails molotov. Tentou fechar as portas, mas um dos atacantes entrou no interior do autocarro, impedindo qualquer fuga. Sem poder arrancar devido ao sistema de segurança que bloqueia a viatura quando existe uma porta aberta, ficou encurralado.
Pelo espelho, viu um dos homens a apontar-lhe uma arma à cabeça. Tentou apelar à calma, mas as garrafas incendiárias começaram a ser lançadas para o posto de condução. O cheiro a gasolina intensificou-se e, quando um dos atacantes acionou um isqueiro no exterior, o fogo invadiu o interior do autocarro, envolvendo Tiago em chamas.
Ainda em combustão, tentou apagar o fogo com as mãos. Aproveitou a fuga dos atacantes para recuperar o telemóvel e as chaves do carro, antes de sair pela porta da frente e correr pela rua, numa cena captada em vídeo e amplamente divulgada na altura.
Foi levado para o Hospital de Santa Maria e internado na Unidade de Queimados, com queimaduras de segundo e terceiro grau na cara, pulmões, mãos, pés e tornozelos. Permaneceu em coma induzido durante uma semana.
Um mês depois, a Polícia Judiciária avançou com uma operação de grande dimensão e deteve vários jovens. Dois homens, de 21 e 23 anos, apontados como principais suspeitos, chegaram a ser presos, mas ficaram apenas dois meses detidos. O Ministério Público mantém o processo sob segredo de justiça. Fontes próximas da investigação confirmam que o caso é complexo e difícil de provar, mas já existem 12 arguidos constituídos, o mesmo número que coincide com a memória de Tiago sobre o grupo que o atacou. Todos se encontram em liberdade.
Mais de um ano depois, Tiago continua a recuperar. Permanece de baixa médica e prepara o regresso à atividade profissional, negociando uma mudança de funções.